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Resenha: Fiados na esquina do ceu com o inferno – Eury Donavio

fiados na esquina do céu com o inferno - eury donavio

Resenha do livro “Fiados na esquina do ceu com o inferno” de Eury Donavio

“Não tem tempo ruim pro ramo de morte, que só faz florescer com falta de chuva. Enchendo as risadas dos vendedores de caixão com ouro.”

Fiados na esquina do céu com o inferno – Eury Donavio

Atenção: esse texto contém spoilers. Se você ainda não leu este livro, recomendo que o faça antes de se aventurar por essas linhas.

Resumo:

Logo nas primeiras páginas o protagonista, também narrador, já dá um vislumbre de sua personalidade, que vai ser importante para o desenrolar da história: ele é um homem sem paciência. Atordoado com o pesadelo recorrente que não o deixa descansar em sono e com a boca seca de sede, se irrita com o jumento que parece rir de sua desgraça e o inclui na caderneta de fiados, um caderninho que leva consigo, onde anota os fiados daqueles que devem um ajuste de contas. O Matador, apelido no protagonista, vai até a bodega da esquina do céu com o inferno procurar pelo índio que bebe veneno de cascavel, que o ajuda há dezesseis anos a procurar pelo Atentador, o diabo que o amaldiçoou com os pesadelos, para matá-lo e, assim, acabar com os pesadelos – a outra opção, perdoar os seus fiados, parece-lhe pior do que os pesadelos. É nessa bodega que conhece La Ursa, o mulambo metido a cordéis, e aceita executar o serviço de matar o Fazedor de Seca antes do dia de São José, em troca da salvação de sua alma. Recebe uma arma, a temperamental Parabelo, e uma bala com uma cruz vermelha na ponta, feita com o sangue do tempo, difícil de produzir e capaz de matar demônios – também santos. Enquanto não encontra o Fazedor de Seca, o Matador vai resolver seus fiados: o primeiro é o jumento que ele quase perdoa, mas acaba metendo uma bala na cabeça do bicho, porque ele continua rindo. O segundo é um ex-amigo de infância / adolescência em quem deu um tiro por causa de provocação: o garoto havia, por ciúme ou despeito, denunciado a Professora que tirava a donzeleza dos meninos da escola, bem na vez que Matador iria tirar a sua. Os meninos se juntaram para assustar o garoto e ele acaba com um tiro na perna de tanto provocar o Matador para que atirasse. Enquanto vai em busca de seus fiados, Matador também procura remédio para a sua falta de paciência, o que acredita que vai ajudá-lo na tarefa de perdoar os desafetos: um elixir, uma pedra milagrosa, uma carranca de ex-voto. Tudo em vão, porque acaba sempre matando. É a partir de então que o leitor e a leitora começam a tomar conhecimento da história do protagonista: a família desgraçada pela seca, a mãe que perdeu os filhos para a morte e para a vida, fugidos, e a constante fuga, da seca e das presepadas. Fugidos por causa do tiro no amigo, mãe e filho acabam em outra cidade, onde o então adolescente Matador se afeiçoa ao Coveiro. É ele também um de seus fiados: acostumado a “beber seus mortos”, ele enche a cara de cachaça sempre quando enterra um e no aniversário de suas mortes, e manipula Matador para matar um coronel no único dia em que ainda não há um aniversário de morte para beber. Sentindo-se traído, o adolescente arruma briga com o homem e foge da cidade, desta vez, abandonando a mãe. Na cidade do sino, ele conhece o Padre, a quem também se afeiçoa. A seu serviço, tenta ganhar o perdão para os seus pecados e também acaba ludibriado: o Padre tem caso com uma Viúva que é fogosa e que conheceu um tal Promotor e, louco de ciúme, o Padre pede que matador dê um jeito no homem. É assim que o Padre também se torna um de seus fiados. Ao buscar o Padre para o acerto de contas, conhece uma mulher, a Luxuosa, que o convence a ir atrás de um outro fiado, mas ele é diferente: no passado, o Matador encontrara a mulher de sua vida, mas perdera a paciência porque a Quenga Honesta não largava o serviço e assim perdera a mulher. É na procura por ela que acaba bem onde está o Fazedor de Seca: no cabaré, acompanhado de La Ursa, Matador encontra com o Índio que bebe veneno de cascavel. No meio da conversa, o Matador descobre que La Ursa na verdade não está do lado do céu na luta da seca, pelo contrário: ele, inclusive, é o Atentador, que acaba morto pela Parabelo, acionada pela Quenga Honesta. O Índio explica para o Matador que o inferno acabou e que a guerra da seca nada mais era que uma disputa do inferno tentando voltar às ativas, e justifica a seca causada por ele: “Ninguém gosta de ver o povo sofrendo, ninguém se atormenta mais que eu. Mas o sofrer opera milagres nas pessoas. Na medida certa, faz penitentes duros como pedra. A privação, o jejum e a sede fazem o povo buscar mais pela oração. Por isso, a seca é a maior escola da fé.”. Assim, portanto, ele mantinha a supremacia do céu. Porém, o Matador havia recebido da Quenga Honesta uma outra bala com a cruz vermelha na ponta; assim, ele engana o Índio e o mata. Logo depois, a chuva cai sobre o sertão.

Comentários da Lis: 

Um romance é muito mais que uma sequência de acontecimentos, uma grande obra é praticamente inexplicável. São muitos os aspectos que fazem de “Fiados na esquina do céu com o inferno” uma grande obra, tenho certeza de que muitos inclusive me passaram desapercebidos, por ser a primeira leitura, ou por ignorância mesmo dos (deliciosos) regionalismos que tangem a história. Mas deixo aqui, humildemente, meus comentários sobre alguns aspectos:

Nem tudo é o que parece: os ajudantes pelo caminho

“Não tem tempo ruim pro ramo de morte, que só faz florescer com falta de chuva. Enchendo as risadas dos vendedores de caixão com ouro.”

Achei especialmente deliciosos os pontos de virada desse livro e a maioria deles tem a ver com as personagens. Logo no começo, o Matador é avisado que o Fazedor de Seca pode assumir qualquer forma; assim como o protagonista, a pessoa que lê é mergulhada em desconfianças. 

O doutor Manipeba, visivelmente um charlatão, que vende uma garrafada de uma mistura que diz curar o Matador da falta de paciência e uma pedra milagrosa muito suspeita, contribui por meios indiretos para essa cura. Ao pedir a moto como pagamento, o doutor priva o protagonista do seu meio de chegar rápido aos lugares; a partir de então, ele terá que se sujeitar às pedras da estrada, que também lhe mostrarão o caminho: é por causa disso que o Matador tem que utilizar o pau de arara, transporte irregular que o permite conhecer a Carranqueira.

Talvez por associação ao doutor, que ainda não sabemos ser um real ajudante do caminho, o leitor e a leitora também desconfiam da Carranqueira e da carranca que faz para o ex voto de paciência do Matador. No entanto, é por causa do presente da carranca encolhida de quixabeira branca, quando afogada na cachaça da Luxúria na bodega dos Sete Pecados, que o Matador recebe a ajuda da Luxuosa.

Sendo uma história narrada em primeira pessoa, o leitor e a leitora ficam à mercê da ingenuidade e da inteligência do protagonista: ele fica cismado com a Luxuosa, lembrando que o Fazedor de Seca pode assumir qualquer forma. Porém, é ela quem o coloca no caminho de novo, convencendo-o a ir atrás da Quenga Honesta. Ela tem a segunda bala com a cruz vermelha na ponta e a entregará para o Matador.

Chegamos então às duas personagens mais importantes depois do Matador: La Ursa e o Índio que bebe veneno de cascavel.

La Ursa, uma das personagens mais carismáticas da história, sabiamente usa da moral do Matador quando ele lhe pergunta sobre sua natureza, anjo ou demônio, respondendo: “Eu luto pela chuva, o que você acha?”. Depois, a pessoa que lê descobre que ele era um demônio, lutando para o inferno voltar às ativas, e precisava da chuva para enfraquecer o céu, já que as rezas fomentadas pela seca o fortaleciam. Achei de uma delicadeza sem tamanho que um diabo, visando os próprios interesses, pudesse usar um elemento que causasse o bem para os humanos na terra.

Já o Índio, aparece mesmo apenas nas partes finais da história, embora o leitor e a leitora sintam que ele está presente em toda a história. Eury constrói essa questão com muita sabedoria: ao conhecer o Índio através do olhar do Matador, o narrador muitas vezes ingênuo, aprendemos a confiar nele tanto quanto o protagonista e é uma surpresa muito especial que ele seja tanto uma entidade a cargo do céu, quando o Fazedor de Seca.

Todos esses ajudantes e a “inversão de papéis” de La Ursa e o Índio são um belíssimo exemplo da importância do narrador para a condução de história que, neste caso em específico, levam o leitor e a leitora ao “erro”, porque ele mesmo se equivocava na percepção dos fatos. No fim, Matador é um protagonista que foi enganado praticamente uma vida inteira e que recebe as sinceras ajudas com desconfiança – e somente quando sai em busca de sua própria salvação.  

O protagonista 

Outro elemento que merece destaque nesse texto é a construção do protagonista. O trecho destacado no início (que descobrimos depois ser a cena da morte do La Ursa) já abre a história com uma versão má da personagem: ele é um matador, alguém que se agrada em puxar o gatilho. Logo depois, há o fiado do Jumento, que naquele momento era apenas um bicho que ria quando ouvia um palavrão e foi morto pela raiva do homem. É uma passagem que causa uma grande comoção por causa do bicho, e um certo ódio do protagonista. De novo, nem tudo é o que parece: o jumento na realidade era um “diabinho arretador”, que dá “o último empurrão em quem tá prestes a fazer uma bagaceira de cabeça quente.”. Vale destacar que essa passagem em específico, no contexto total da obra, já é um primeiro passo na busca do protagonista por sua paciência e a habilidade de perdoar; percebemos só depois que a intuição do Matador já se aguçava ali e o que pareceu uma ruindade gratuita, na verdade, já o aproximava da retomada de sua própria vida.

Ao longo da narrativa, a pessoa que lê descobre um Matador muito humano: sofre pelo sofrimento da mãe e não quer dar mais desgostos a ela, muitas vezes agiu como um adolescente consumido pelos hormônios em busca de sexo, foi ingênuo a ponto de confiar em pessoas que só o usavam para os próprios propósitos, quis e trabalhou para obter o perdão, assim como ser uma pessoa melhor. Percebe-se que a violência da personagem não é desgovernada, mas movida por uma raiva, ou pela carência de afeto e cuidados genuínos. As mortes que ocorrem através de suas mãos, não que isso justifique o ato de matar, acontecem, no passado, porque ele achava estar fazendo algo bom para outras pessoas (como proteger a mãe contra o coronel, ou eliminar uma pessoa que um Padre dizia ser ruim). No presente, salvo o jumento que descobrimos depois ser em razão de sua intuição, o assassinato do ex amigo foi em defesa própria, ainda que tivesse ido até lá para matar, e a morte do coveiro é quase como um presente de compadre.

O desenvolvimento do protagonista, portanto, diz mais respeito à sua busca pela capacidade de perdoar do que a transformação do que é mau no bom. Não é à toa que é nos braços da Quenga Honesta, seu grande amor e porto de sossego, a quem perdoou e foi perdoado, que ele enfim descobre o que tem que ser feito.

Achei interessante também que a personagem passasse maior parte da história sem comer; a falta de alimento para o corpo, a azia da cachaça solitária nas tripas, além de ser um recurso riquíssimo para relembrar as marcas da seca ao longo da história, também formam uma metáfora poderosa para a desnutrição emocional do protagonista.

A luxúria e a cachaça

“Meu filho, certo e errado não tem cerca marcando onde acaba um e começa o outro. Se tivesse separação seria mais fácil de acertar. Pra enxergar bem a separação dos dois, só juntando duas coisas: os livros e a estrada. Mas apenas eles não bastam. Ainda necessita fazer a costura deles. E a linha de costurar sapiências é a cachaça, que embaralha tudo numa mistura só, pra depois o juízo catar as pequenezas da sabedoria.”

Como uma boa cachaceira e pessoa respeitosa a tudo que envolve o sexo, precisava destacar esses dois pontos, que, na minha humilde opinião, engrandecem muito a história.

Do ponto de vista religioso, existem algumas “regras” e condutas a que uma pessoa em vida deve se atentar para garantir um pós-morte tranquilo; na maioria das religiões, o sexo e a luxúria, assim como os vícios, não são encarados como virtudes. Neste livro, pelo contrário, a safadeza e a cachaça são elementos fortalecedores do protagonista. Para mim, uma das partes mais importantes dessa questão (e do livro) é quando há essa convergência no bar do Sete Pecados: a cachaça entornada sobre a carranca em miniatura é o que chama a Luxuosa, que, depois do sexo com o Matador, o coloca no caminho certo para sua busca.

Temos essa esquina do céu com o inferno, que é uma bodega (aliás, belíssima imagem desse bar, com duas portas de um lado, três do outro – queria mesmo saber o que teria acontecido se ele tivesse entrado por outra porta). Como negar que a cachaça é também um elemento divino? Já se dizia que “a diferença entre o remédio e o veneno está na dose”, não é mesmo? Tampouco o sexo, um ato de amor e prazer, que gera vida, sendo feito com alegria, como pode ser mau?

Dois rótulos poderiam ser colocados no protagonista, o libertino e o bêbado, para justificar uma classificação de anti-herói; para mim, o Matador é um herói, afinal, qual foi o herói que nunca matou? 

A obra toda acaba por ser uma bola de demolição para as estruturas de conceitos e pré-conceitos. Isso é poderosíssimo e cheio de beleza.

As mulheres desta obra

“Ela sempre foi minha mulher. Não que eu tivesse ela, era ela quem me tinha.”

Não sei se foi uma preocupação específica do autor, mas sendo o feminismo uma pauta em evidência nos últimos tempos, personagens femininas criadas por um escritor homem são uma questão delicada. Fiquei extremamente satisfeita e feliz por acompanhar essa história que traz mulheres, embora em papéis mais secundários na aventura, muito bem construídas. 

A primeira que eu gostaria de destacar é essa mãe que perde todos os filhos para a “morte e para a vida”, mas que sempre fez tudo o que está em seu alcance para mantê-los protegidos, inclusive fugir de uma cidade em razão da presepada do filho que restou. Depois, em conversa com o Coveiro, o filho descobre que a mãe foi embora com um caminhoneiro, não antes de virar namoradeira, superado o luto do abandono do seu último filho. Verdade ou não, é interessante a ideia de que uma mulher continua vivendo e aproveitando a vida como deve, mesmo depois de perder os filhos, sem ser retratada como desnaturada. É uma personagem dotada de um autoconhecimento esplêndido para se permitir ser sem os filhos, com a consciência tranquila de ter feito tudo o que poderia ter feito.

Temos também a figura da Carranqueira, que parece meio suspeita de início, mas é uma das personagens mais importantes do livro; além de ser a que fornece o amuleto e trata o Matador com certo carinho, maternal, é ela quem socorre o protagonista do pesadelo e, no fim, diz as palavras que ele precisa ouvir para retornar. Na minha opinião, foi bastante delicada e acertada a escolha de uma figura feminina para representar a autoridade do poder divino, do que é bom, trazendo consigo toda a simbologia do feminino em relação à vida, como se ele estivesse renascendo.

Aí temos “a mulher do Matador”, a Quenga Honesta. Ela não deixa de ser quenga porque precisava sustentar a mãe e a irmã; ainda que pudesse explicar para o homem e ser compreendida, mantém sua decisão firme: se o homem a quer, vai tê-la sob as condições dela, não importa o motivo.

Aliás, essa é outro aspecto do livro que achei bastante interessante: muitas das personagens femininas são prostitutas, mas a obra está longe de colocar a mulher em um papel de objeto sexual, pelo contrário. São muitas as passagens em que o Matador mostra interesse em aprender como satisfazer suas parceiras sexualmente, e de fato o faz. Talvez a figura da Professora da Safadeza seja a única que me causou algum desconforto, mais pela questão da sedução dos meninos em idade escolar do que o seu apetite sexual em si. Mas em se tratando de ficção é totalmente perdoável, também precisamos das personagens más.

Para mim, todas essas mulheres são maravilhosas. Porém, a que mais me cativou foi a Luxuosa. A cena do bar dos Sete Pecados é icônica: a Luxuosa diz que o Matador tem que lamber o Mel Rachado para poder falar com o Padre (que já estava morto); quando o homem termina o serviço, ela diz: “Bastava eu querer pra tu enxergar o padre, precisava das lambidas não. Mas achei justo receber parte do meu serviço adiantado.”. Se isso não é uma expressão do poder dessa mulher, não sei o que seria. Depois, no quarto do cabaré, é ela quem incentiva o Matador ir atrás da mulher que ele ama: que mulher manda o homem para os braços de outra? Para mim, a Luxuosa é a expressão máxima do amor, em todos os sentidos.

O equilíbrio cósmico

Outra coisa que acho digna de nota é o tema da luta entre o bem e o mal, aqui representados pelo Céu e Inferno, colocado de maneira bastante original. A Seca acaba sendo uma consequência dessa guerra divina e a descoberta de que era o Céu quem estava impedindo a chuva de cair é uma surpresa no final do livro. Depois, de forma mais profunda, se compreende a mensagem: qualquer instituição (neste caso, o Céu) que perca de vista sua razão de ser está sujeita a causar o mal que visava evitar. A prova de fé, instituída pela seca, levava as pessoas ao Céu; com o Inferno fechado, o Céu também recebia as pessoas que não tinham fé. Então, qual o ponto? Talvez o Matador percebesse que o Céu, com toda aquela gente, também as más, se parecesse demais com a própria terra, descobrindo, assim, que em termos de propósito de ser, o Inferno é tão necessário quanto o Céu é bom. A terra também tem o seu papel no equilíbrio; deixemos a chuva por conta do ciclo das águas.

“O dia de São José amanheceu triste, não por causa da morte do Índio, mas pela falta de esperanças naquele céu tão azul.”

Esse trecho, no finalzinho, me causou um furor. Frequentemente, um céu azul, um sol brilhando, são associados a um “dia bonito”. A estranheza da associação de uma manhã triste ao céu tão azul logo deu lugar a um sorriso ao lembrar-me da multiplicidade do belo.

Notas sobre o aspecto formal e estilístico do autor

Confesso que o início do livro foi difícil para mim. Pessoalmente, demoro algumas páginas para engatar em uma leitura, até me acostumar com o estilo de narrativa – frequentemente volto para reler as primeiras páginas mais tarde. Esse não foi diferente, com um “agravante”: o autor usa um léxico bastante regional, lindíssimo, que, para esta mulher urbana de origem paulistana, apresentou-se um desafio. No entanto, o ritmo é bastante fluído e eu, que tenho certa resistência a parar a leitura para fazer pesquisas, passei a encarar essa leitura como a leitura em uma língua estrangeira que conheço mais ou menos, adivinhando significados pelo contexto. E deu muito certo! Além de não atravancar a minha leitura, a escrita de Eury é tão decidida, tão confortável em si mesma, que eu confiei e fui. 

Outro aspecto que me encantou foi a oralidade: somado isso ao narrador em primeira pessoa, me senti uma amiga do protagonista ouvindo um causo no balcão de um bar, acompanhada de uma boa dose de cachaça.

A narrativa também é original no humor: há poucas piadas, mas a personalidade de certa forma bruta do protagonista é um material bastante rico de graça. Logo no começo, me deliciei com a ideia de um homem perder a cabeça com o riso de um jumento. Por último, queria destacar a sutileza das ironias dessa história. Aqui vai uma para ilustrar: não é divertido que o Índio, aquele que deveria fazer a dança da chuva, seja o Fazedor de Seca?

Deixo aqui alguns trechos que gostei bastante e que me inspiraram:

“Eram só uns trocados de mim tentando ser eu”

“A raiva adubou a força das pernas”

“Não conhecia sossego de sono daquele jeito, com cama e perdão forrando um canto macio pra dormir em paz.”

“Bastava ele falar pra desconfiança dele pegar na cabeça dos outros feito piolho.”

Premiações

Prêmio da Cidade de Manaus (2019) – Vencedor
Prêmio São Paulo de Literatura (2020) – Finalista

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Ou com o próprio autor. Fala com ele pelo Instagram: @eurydonavio

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